5.2.1. CONTAGEM, PRORROGAÇÃO E RECONDUÇÃO DOS PRAZOS PROCESSUAIS
A contagem do prazo do Processo Administrativo Disciplinar tem início com a publicação do extrato da portaria de instauração no Diário do Executivo, ou seja, quando é dada publicidade ao ato de instauração.
Conforme dispõe o art. 280 da Lei n° 869/1952, “os prazos previstos neste Estatuto serão, todos, contados por dias corridos, salvo as exceções previstas em lei”. Considerando que no Estatuto não existe previsão quanto ao início e fim dos prazos, aplica-se subsidiariamente a Lei Estadual n° 14.184/2002 (processo administrativo em geral), que prevê:
Art. 59 – Os prazos começam a correr a partir do dia da ciência oficial do interessado, excluindo-se da contagem o dia do começo e incluindo-se o do vencimento.
§ 1° – Considera-se prorrogado o prazo até o primeiro dia útil seguinte ao do vencimento se este cair em dia em que não houver expediente na repartição ou em que for ele encerrado antes do horário normal.
§ 2° – Os prazos fixados em meses ou anos se contam de data a data e, se no mês do vencimento não houver o dia equivalente àquele do início do prazo, tem-se como termo o último dia do mês.
§ 3° – Os prazos expressos em dias contam-se de modo contínuo.
Considera-se, ainda, quanto à contagem de prazos, o art. 224 do Código de Processo Civil:
Art. 224. Salvo disposição em contrário, os prazos serão contados excluindo o dia do começo e incluindo o dia do vencimento.
§ 1° Os dias do começo e do vencimento do prazo serão protraídos para o primeiro dia útil seguinte, se coincidirem com dia em que o expediente forense for encerrado antes ou iniciado depois da hora normal ou houver indisponibilidade da comunicação eletrônica.
§ 2° Considera-se como data de publicação o primeiro dia útil seguinte ao da disponibilização da informação no Diário da Justiça eletrônico.
§ 3° A contagem do prazo terá início no primeiro dia útil que seguir ao da publicação.
Portanto, em relação ao início da contagem, para definir qual regra irá prevalecer, deve-se diferenciar entre os prazos destinados à Administração Pública (comissão processante e autoridade) e aqueles direcionados à defesa (prazos para manifestação, apresentação de defesa prévia, de alegações finais ou de provas).
Quanto aos prazos direcionados à comissão ou à autoridade (prazo para conclusão dos trabalhos, prazo para julgamento, etc.), aplica-se a Lei n° 14.184/2002. Isso porque a aplicação das normas do CPC ocorrerá somente quando não houver disposição sobre a matéria ou esta precisar de uma complementação. Esse não é o caso do dispositivo da lei estadual de processo administrativo, que dispõe, de forma clara, sobre a contagem do prazo.
Assim, para a Administração Pública (comissão e autoridade), na contagem do prazo excluise o dia do começo (data da publicação do ato), independentemente se for dia útil ou não, e inclui-se o dia do vencimento, prorrogando-se automaticamente caso caia em dia em que não houver expediente na repartição ou este for encerrado antes do horário normal.
Exemplificando, tendo a comissão, inicialmente, 60 (sessenta) dias para conclusão dos trabalhos, a contagem desse prazo inicia-se no dia seguinte ao da publicação da instauração no Diário do Executivo. Se, por exemplo, a publicação ocorreu em uma sexta-feira, começa-se a contar o prazo no sábado. A data final do prazo será no dia em que se encerrarem os 60 (sessenta) dias. Se esta data cair em um dia em que não houver expediente na repartição ou em que for ele encerrado antes do horário normal, prorroga-se para o próximo dia útil. Assim, se, por exemplo, o término do prazo ocorrer em um sábado ou em um domingo, considera-se seu encerramento na segunda-feira.
Entretanto, em relação aos prazos destinados aos processados (prazo conferido pela comissão para apresentação de defesa, por exemplo), deve ser considerado o prazo mais benéfico, garantindo-se o contraditório e a ampla defesa. Altera-se, assim, o entendimento em relação à data do início do prazo, aplicando-se a regra do CPC, segundo o qual a contagem do prazo não deve se iniciar em dias não úteis. Dessa forma, o dia do começo do prazo é postergado automaticamente para o próximo dia útil se cair em feriado, final de semana ou em dia em que o expediente for encerrado antes ou iniciado depois da hora normal.
Esse é o entendimento da CGU, que orienta ainda que, excepcionalmente, a comissão poderá receber as manifestações de defesa apresentadas fora do prazo, em especial quando não houver conduta manifestamente protelatória e prejuízo ao andamento regular do processo.
Frise-se, trata-se de uma exceção, uma interpretação em favor do pleno exercício de ampla defesa, que vai ao encontro de orientação normalmente fornecida pela CGU no sentido de que, no curso da apuração, as manifestações da defesa não deverão ser rejeitadas unicamente por conta de eventual intempestividade (observados, sempre, no caso concreto, os limites necessários a não inviabilizar o próprio deslinde eficaz dos trabalhos).175
Na Lei n° 869/1952 estão discriminados alguns prazos atinentes à condução do Processo Administrativo Disciplinar, sendo eles: prazo para o início do processo, para a conclusão da instrução, para apresentação de defesa, para elaboração de relatório final e para o julgamento:
Parágrafo único - Por motivo de força-maior, poderá a autoridade competente prorrogar os trabalhos da comissão pelo máximo de 30 dias.
[...]
Art. 225 - Ultimado o processo, a comissão mandará, dentro de quarenta e oito horas, citar o acusado para, no prazo de dez dias, apresentar defesa.
[...]
Art. 227 - Esgotado o prazo referido no art. 225, a comissão apreciará a defesa produzida e, então, apresentará o seu relatório, dentro do prazo de dez dias.
[...]
Art. 229 - Entregue o relatório da comissão, acompanhado do processo, à autoridade que houver determinado à sua instauração, essa autoridade deverá proferir o julgamento dentro do prazo improrrogável de sessenta dias.
[...]
Art. 230 - Quando escaparem à sua alçada as penalidades e providências que lhe parecerem cabíveis, a autoridade que determinou a instauração do processo administrativo, propô-las á dentro do prazo marcado para julgamento, à autoridade competente.
§ 1° - Na hipótese deste artigo, o prazo para julgamento final será de quinze dias, improrrogável.
§ 2° - A autoridade julgadora promoverá as providências necessárias à sua execução.
Esses prazos, como se explicará adiante, totalizam 150 (cento e cinquenta) dias. Conforme a jurisprudência176, esse é o prazo que se considera como o previsto em lei para início e finalização de um processo. Quanto aos trabalhos da comissão, esta possui, de acordo com o Estatuto, 90 (noventa) dias (60 dias, prorrogáveis por mais 30 dias) para conclusão dos trabalhos, incluindo instrução processual, defesa, relatório final e remessa à autoridade julgadora.
No entanto, a jurisprudência tem entendido que esses prazos são impróprios e dilatórios (e não peremptórios). Como explica Elpídio Donizetti, prazos próprios são aqueles “destinados à prática dos atos processuais pelas partes” e, “uma vez não observados, ensejam a perda da faculdade de praticar o ato, incidindo o ônus respectivo (preclusão temporal)”177. Os impróprios são “os prazos atinentes aos atos praticados pelo juiz” que, diferentemente dos próprios, “uma vez desrespeitados, não geram qualquer consequência no processo”178. Quanto à possibilidade de prorrogação, os prazos peremptórios são aqueles que não podem ser dilatados, ao contrário dos dilatórios, que podem ser ampliados ou reduzidos de acordo com a convenção das partes179.
Por isso, sendo os prazos para conclusão e julgamento do PAD impróprios e dilatórios, caso sejam ultrapassados, o processo não deverá ser anulado. Esse entendimento se justifica pelas dificuldades que podem ocorrer durante a instrução, e que, portanto, podem ocasionar demora na conclusão do processo. Além disso, a dilação do prazo não causa perda de faculdade do processado nem prejuízo à defesa.
Entretanto, apesar da permissão para dilação desses prazos, a comissão deverá se atentar para o princípio da duração razoável do processo e o prazo prescricional, devendo justificar à autoridade instauradora a necessidade da prorrogação dos prazos. Citam-se alguns julgados sobre o assunto:
AGRAVO - MANDADO DE SEGURANÇA - PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR - LEI MUNICIPAL 2.503/06 - EXCESSO DE PRAZO - COMISSÃO PROCESSANTE - O excesso de prazo para conclusão de Processo Administrativo Disciplinar, desde que não cause prejuízo ao servidor, não conduz a sua nulidade. - A Comissão Processante deve ser composta por três servidores estáveis, com o objetivo de garantir a imparcialidade destes, na instrução do processo.180
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO. PROCESSO
ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PENA DE CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. INEXISTÊNCIA DE VÍCIOS CAPAZES DE MACULAR A LEGALIDADE DO PROCEDIMENTO DISCIPLINAR. SEGURANÇA DENEGADA. 1. É possível a substituição dos membros da comissão processante, desde que os novos membros designados preencham os requisitos legais para o exercício dessa função. 2. A documentação apresentada pela impetrante não se mostra suficiente para infirmar a imparcialidade de qualquer dos membros da comissão processante, não constituindo o mandado de segurança via adequada para a análise pormenorizada da questão, dada a necessidade de dilação probatória. 3. O excesso de prazo para conclusão do Processo Administrativo Disciplinar não é causa de nulidade quando não demonstrado nenhum prejuízo à defesa do servidor. 4. Desde que devidamente fundamentado, o indeferimento de novas provas consideradas impertinentes ou de nenhum interesse para o esclarecimento dos fatos, a juízo da comissão processante, não macula a integridade do Processo Administrativo Disciplinar. [...]. 10. Segurança denegada.181
Para legitimar a atuação da comissão na instrução do processo, se ultimado o prazo legal, a autoridade instauradora deverá reconduzir a comissão para um novo prazo de instrução, ou seja, por mais 60 (sessenta) dias, sucessivamente, desde que devidamente justificado, até a entrega do relatório final.
Após a entrega do relatório, a autoridade julgadora terá o prazo de 60 (sessenta) dias para julgar, se a penalidade sugerida pela comissão for de sua competência (art. 229 do Estatuto). Caso contrário, a autoridade terá esse prazo para indicar os fundamentos para a aplicação da penalidade cabível e remeter o processo à autoridade competente, que terá o prazo de 15 (quinze) dias para o julgamento (art. 230 do Estatuto). Esses prazos também não são peremptórios, seguindo, portanto, a mesma lógica das jurisprudências apresentadas.
Ressalta-se que os atos praticados pela comissão antes da instauração e fora da competência que lhe é atribuída podem ser considerados nulos, se não convalidados. Por isso, deve-se ter especial atenção para a adequada publicação de portarias de instauração, prorrogação e recondução dos procedimentos disciplinares, evitando-se que atos sejam praticados sem a sua cobertura. Após a publicação, os atos devem ser juntados aos autos, em ordem cronológica, de modo a evitar dúvidas sobre o amparo legal do processo.
Observa-se, por fim, que a questão dos prazos é relevante, considerando, em especial, a prescrição da pretensão punitiva do Estado. A instauração do Processo Administrativo Disciplinar interrompe a contagem do prazo prescricional. No entanto, este passará a ser contado novamente (desconsiderando-se o tempo já decorrido) após 150 (cento e cinquenta) dias. Em outras palavras, após 150 dias, a contar da publicação do extrato de portaria, reinicia-se a contagem do prazo prescricional, o qual, em regra, não poderá ser mais interrompido até o julgamento.
Excepcionalmente, conforme disposto no art. 60 da Lei nº 14.184/2002, com redação dada pela Lei nº 23.629/2020182, os prazos processuais poderão ser interrompidos ou suspensos quando houver uma situação de emergência, calamidade pública ou força maior, além, é claro, de previsão legal. Havendo interrupção do prazo processual, o reinício da contagem do prazo prescricional se dará a partir da data de decretação das referidas situações. Havendo suspensão, o prazo prescricional ficará suspenso a partir da entrada em vigor do decreto que reconhecer a situação excepcional. Assim expressa o mencionado art. 60 da Lei nº 14.184/2002:
Art. 60 – Os prazos processuais não se interrompem nem se suspendem, salvo:
I – quando houver previsão legal;
II – em situação de emergência, estado de calamidade pública ou em caso de força maior.
§ 1º – Em relação ao Poder Executivo, a interrupção ou a suspensão dos prazos dos processos administrativos em razão do disposto no inciso II do caput dependerá de decreto
do Governador do Estado.
§ 2º – Em relação ao Poder Legislativo, ao Poder Judiciário, ao Ministério Público, ao Tribunal de Contas do Estado e à Defensoria Pública, a interrupção ou a suspensão dos prazos dos processos administrativos em razão do disposto no inciso II do caput dependerá de ato normativo de cada Poder ou órgão.
§ 3º – Nas hipóteses de interrupção de prazo processual no âmbito do Poder Executivo em razão do disposto no inciso II do caput, o reinício da contagem do prazo prescricional se dará a partir da data da decretação da situação de emergência, do estado de calamidade pública ou da força maior.
§ 4º – Nas hipóteses de suspensão de prazo processual no âmbito do Poder Executivo em razão do disposto no inciso II do caput, o prazo prescricional ficará suspenso a partir da entrada em vigor do decreto a que se refere o § 1º e enquanto durarem seus efeitos.
§ 5º – O disposto neste artigo não se aplica ao processo administrativo tributário, que está sujeito a legislação especial.
(Artigo com redação dada pelo art. 1º da Lei nº 23.629, de 2/4/2020.)
A prescrição foi tratada com detalhes no tópico 2.8 deste Manual.
177 DONIZETTI, Elpídio. Os prazos processuais. Disponível em https://portalied.jusbrasil.com.br/arts./382248385/os-prazos- processuais . Acesso em: 29 mai. 2018.
178 DONIZETTI, Elpídio. Os prazos processuais. Disponível em https://portalied.jusbrasil.com.br/arts./382248385/os-prazos- processuais . Acesso em: 29 mai. 2018.
179 DONIZETTI, Elpídio. Os prazos processuais. Disponível em https://portalied.jusbrasil.com.br/arts./382248385/os-prazos- processuais . Acesso em: 29 mai. 2018.
180 TRIBUNAL DE JUSTÇA DE MINAS GERAIS. AI: 10319140003546001 MG, Relator: Jair Varão, Data de Julgamento: 15/05/2014, Câmaras Cíveis / 3ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 30/05/2014.
181 SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. MS: 13074 DF 2007/0213518-3, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Julgamento: 27/05/2015, S3 - TERCEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 02/06/2015.
182 Lei nº 23.629, de 02 de abril de 2020: Altera o art. 60 da Lei nº 14.184, de 31 de janeiro de 2002, que dispõe sobre o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Estadual.