5.1.1. COMPETÊNCIA PARA INSTAURAÇÃO

O art. 219 da Lei n° 869/1952 delimita quais autoridades têm competência para a instauração do Processo Administrativo Disciplinar:

Art. 219 - São competentes para determinar a instauração do processo administrativo os Secretários de Estado e os Diretores de Departamentos diretamente subordinados ao Governador do Estado. 

Pela literalidade do artigo, verifica-se que qualquer Secretário de Estado poderá instaurar o processo. No entanto, essa competência é limitada à instauração de procedimento em face dos agentes lotados no respectivo órgão ou relativo a fatos praticados no âmbito daquela Secretaria.

A expressão “Diretores de Departamentos diretamente subordinados ao Governador” compreende as autoridades máximas das entidades da Administração Indireta (autarquias, fundações e empresas públicas), responsáveis pela apuração dos ilícitos disciplinares em face de seus servidores ou empregados. Essa competência poderá ser delegada conforme necessidade e conveniência da autoridade.

Portanto, em regra, o PAD será instaurado pela autoridade competente no órgão ou entidade em que ocorreu o fato irregular. Segundo entendimento doutrinário, a razão para se adotar o lugar da prática do ato supostamente irregular como o local de instauração do procedimento administrativo é a de facilitar a coleta de provas e a realização de diligências. Isso porque a autoridade titular do órgão ou entidade no qual ocorreram as supostas irregularidades é aquela que melhor reúne condições de determinar a produção das provas necessárias para a comprovação ou não dos fatos noticiados.

Conforme dispõe o Manual de Processo Administrativo Disciplinar170 da Controladoria-Geral da União:

No aspecto espacial, o processo disciplinar será instaurado, preferencialmente, no âmbito do órgão ou instituição em que supostamente tenha sido praticado o ato antijurídico. Essa regra geral tem o propósito de facilitar a coleta de provas e a realização de diligências necessárias à elucidação dos fatos controversos.

Excetuam-se a essa regra as situações previstas no artigo 46, § 1º, incisos V, VII e XVIII, da Lei Estadual n° 24.313/2023 c/c o artigo 35, incisos II, III e VI, do Decreto Estadual n° 48.687/2023, nas quais se recomenda a instauração do procedimento pela Corregedoria-Geral.

A Lei n° 24.313/2023, no seu art. 46, § 1º, inciso V, estabelece a competência da CGE para a instauração de Processo Administrativo Disciplinar em face de qualquer agente público, inclusive detentor de emprego público, no âmbito do Estado de Minas Gerais.

Nesse contexto, a Corregedoria-Geral poderá avocar PAD em curso em órgão ou entidade do Poder Exercutivo Estadual, promovendo, inclusive, a aplicação da penalidade administrativa cabível. Assim como, se for o caso, poderá declarar a nulidade de Sindicância, Processo Administrativo Disciplinar ou outro procedimento de caráter disciplinar realizado no respectivo órgão/entidade, promovendo a imediata e regular apuração dos fatos constantes nos autos.

Em síntese, a instauração dos processos administrativos disciplinares, em princípio, cabe ao gestor máximo de cada órgão ou entidade, o qual, por conveniência e oportunidade, pode delegar a competência a outro gestor de sua pasta, ao chefe da Controladoria Setorial/Seccional ou, ainda, ao respectivo Coordenador do Núcleo de Correição Administrativa.

Inobstante, em algumas circunstancias, recomenda-se que a instauração do processo ocorra no âmbito da CGE. Se já instaurado, o procedimento poderá ser avocado pela Corregedoria- Geral, com base no art. 35, inciso III, do Decreto Estadual n° 48.687/2023:

Art. 35 – A Corregedoria-Geral tem como competência coordenar e aplicar o regime disciplinar aos agentes públicos e coordenar a responsabilização de pessoas jurídicas prevista na Lei Federal nº 12.846, de 2013, no âmbito do Poder Executivo, com atribuições de: [...]
III – avocar sindicância, processo administrativo disciplinar e outros processos administrativos instaurados em desfavor de agente público, inclusive detentor de emprego público, em curso em órgão ou entidade do Poder Executivo, promovendo a apuração e a aplicação da penalidade administrativa cabível, em especial por:
a) inexistência de condições objetivas para sua realização no órgão ou na entidade do Poder Executivo de origem;
b) complexidade, relevância da matéria ou valor do dano ao patrimônio público;
c) envolvimento de autoridade;
d) envolvimento de servidores de mais de um órgão ou entidade;

Trata-se, portanto, de situações que, por sua complexidade, relevância ou impacto no serviço público, devem ser apuradas no órgão central de controle interno do Estado. No caso de infrações cometidas por servidores cedidos a outros órgãos, o Manual da CGU171 adverte:

[...] a competência é do órgão onde ocorreu a irregularidade para a instauração do processo disciplinar. Todavia, como o vínculo funcional do servidor se dá com o órgão cedente, apenas a este incumbiria o julgamento e aplicação da penalidade (Nota DECOR/CGU/AGU N° 016/2008-NMS).
A competência para julgar processo administrativo disciplinar envolvendo servidor cedido a outro órgão ou instituição só pode ser da autoridade a que esse servidor esteja subordinado em razão do cargo efetivo que ocupa, ou seja, da autoridade competente no âmbito do órgão ou instituição cedente.
Essa competência decorre do princípio da hierarquia que rege a Administração Pública, em razão do qual não se pode admitir que o servidor efetivo, integrante do quadro funcional de um órgão ou instituição, seja julgado por autoridade de outro órgão ou instituição a que esteja apenas temporariamente cedido.
É fato que o processo administrativo disciplinar é instaurado no âmbito do órgão ou instituição em que tenha sido praticado o ato antijurídico. Entretanto, tão logo concluído o relatório da comissão processante, deve-se encaminhá-lo ao titular do órgão ou instituição cedente para julgamento. (Nota DECOR/CGU/AGU n° 10/2008-JD)

Outra situação refere-se à hipótese de servidor investido em cargo público na Administração Direta, que ocupava, à época do cometimento das supostas irregularidades, um cargo em comissão em empresa pública (entidade da Administração Indireta), cujo quadro de pessoal é regido pelaConsolidação das Leis do Trabalho – CLT.

A CGU explicita que o servidor, nesta condição, será alcançado pelo Estatuto do Servidor (no âmbito federal, Lei n° 8.112/1990):

Este fato não retira sua condição de servidor público estatutário regido pela Lei nº 8.112/90. Logo, por expressa previsão legal, só poderia ser processado por comissão de PAD ou sindicância acusatória/punitiva constituída por servidores públicos estáveis.

Dessa forma, considerando a necessidade de se designar servidores estáveis para comporem a comissão, verifica-se a impossibilidade de o presidente da empresa pública o fazer. É que seu poder hierárquico é, em princípio, restrito aos empregados de sua empresa. Assim, em situações como esta, de forma excepcional, o PAD deverá ser instaurado pela autoridade do órgão ou entidade em que o servidor possua um vínculo efetivo, ou seja, a Administração Direta. Eis um exemplo de caso de exceção à regra geral, em que as apurações de irregularidades são realizadas no órgão ou entidade diverso daquele onde os fatos ilícitos teriam supostamente ocorrido, ou ainda, pela própria CGU. 172

Já o empregado público de estatal, que comete irregularidade funcional enquanto cedido para ocupar cargo em comissão na administração direta, autárquica ou fundacional, sujeita-se ao Processo Administrativo Disciplinar previsto no Regime Estatutário, uma vez que se encontra investigo em cargo público.

[...] O processo deverá ser instaurado pela autoridade competente do local do fato e conduzido sob observância dos requisitos da lei. Ao seu fim, competirá igualmente à autoridade do local do fato julgar o feito, uma vez que o empregado ocupa cargo público vinculado àquela unidade e, portanto, nessa condição, submete-se à sua estrutura hierárquica. De se frisar que, a depender da gravidade da infração, a autoridade competente poderá impor a pena de destituição do cargo em comissão a teor do que dispõe o art. 135 da Lei n° 8.112/90. O resultado deste processo disciplinar deve ser encaminhado a sua empresa estatal de origem, para adoção das medidas cabíveis, especialmente no que toca à verificação dos reflexos no contrato de trabalho existente. Isto porque, ainda que cedido, o empregado público mantém sua relação de emprego com a estatal da qual se origina, devendo observância aos seus regulamentos internos, inclusive no que diz respeito aos deveres e proibições a ele impostos.173

Ressalta-se que é dever da autoridade competente comunicar à empresa estatal a existência de indícios de irregularidade envolvendo empregado público a ela vinculada, independentemente da decisão que venha a se adotar acerca da lotação do empregado público (permanência no órgão ou devolução à estatal de origem).


170 CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO. Manual de Processo Administrativo Disciplinar. Brasília: 2022. P. 87.
171 CONTROLADORIA-GERAL DAUNIÃO. Manual de Processo Administrativo Disciplinar. Brasília: 2022. P. 88.

172 CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO. Manual de Processo Administrativo Disciplinar. Brasília: 2022. P. 88.
173 CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO. Manual de Processo Administrativo Disciplinar. Brasília: 2022. P. 30.