5.2.8. PROVA

A instrução do Processo Administrativo Disciplinar consiste na produção de provas a fim de se verificar os fatos apurados, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa. A função da comissão processante é impulsionar o processo para, ao final, subsidiar, com o conjunto probatório, a decisão da autoridade competente.

Para isso, a comissão deve buscar todos os meios de prova admitidos em direito para a verificação do ocorrido. Os arts. 224 e 227 da Lei n° 869/1952 dispõem sobre a produção de provas pela comissão:

Art. 224 - A comissão procederá a todas as diligências que julgar convenientes, ouvindo, quando necessário, a opinião de técnicos ou peritos.
Parágrafo único - Terá o funcionário indiciado o direito de, pessoalmente ou por procurador, acompanhar todo o desenvolver do processo, podendo, através do seu defensor, indicar e inquirir testemunhas, requerer juntada de documentos, vista do processo em mãos da comissão e o mais que for necessário a bem de seu interesse, sem prejuízo para o andamento normal do trabalho.
[...]
Art. 227 - Esgotado o prazo referido no art. 225, a comissão apreciará a defesa produzida e, então, apresentará o seu relatório, dentro do prazo de dez dias.
§ 1° - Neste relatório, a comissão apreciará em relação a cada indiciado, separadamente, as irregularidades de que forem acusados, as provas colhidas no processo, as razões de defesa, propondo, então, justificadamente, a absolvição ou a punição, e indicando, neste caso, a pena que couber.
§ 2° - Deverá, também, a comissão em seu relatório, sugerir quaisquer outras providências que lhe pareçam de interesse do serviço público.

O acusado também tem o direito de produzir provas no processo, mas, para ele, isso é uma faculdade. Por outro lado, para a comissão (enquanto Administração Pública), a produção de provas é um encargo, um poder-dever, sob pena de se concluir pelo arquivamento dos autos por falta de provas. A Lei n° 14.184/2002 também disciplina a produção de provas:

Art. 5° – Em processo administrativo serão observados, dentre outros, os seguintes critérios:
[...]
VIII – garantia do direito à comunicação, à produção de provas, à apresentação de alegações e à interposição de recurso;
[...]
Art. 23 – Os atos de instrução do processo se realizam de ofício, por iniciativa da Administração, sem prejuízo do direito do interessado de produzir prova.
Art. 24 – Admitem-se no processo os meios de prova conhecidos em direito.
Parágrafo único – Será recusada, em decisão fundamentada, a prova considerada ilícita, impertinente, desnecessária ou protelatória.

A doutrina reforça a ideia de que o conjunto probatório é essencial para a elucidação dos fatos e para a decisão da autoridade julgadora, sob pena de nulidade, como mostram os trechos a seguir das obras de Alencar Carvalho e de Lucio Dezan: 

Mais ainda, a prova se justifica na medida em que a responsabilidade administrativa do servidor público não é objetiva (decorrente da mera ocorrência do evento material), mas depende de comprovação do ânimo subjetivo censurável do apontado infrator, da evidenciação de sua culpa ou de seu dolo no cometimento da conduta reprovável.202

A finalidade da prova disciplinar é o convencimento de seu destinatário. Apresenta o escopo de convencer a respeito da ocorrência funcional sobre a ocorrência ou inocorrência de acontecimentos, declinando, assim, um viés de demonstração da verdade (possível ou jurídica) sobre algo relevante para o mundo jurídico delimitado na lide administrativa.203

As provas podem ser testemunhais, documentais e periciais. Mais adiante, cada uma dessas espécies de provas será analisada. Na análise do conjunto probatório, a comissão processante não deverá considerar as provas de maneira isolada, mas em conjunto e diante do contexto apuratório. Essa avaliação do conjunto probatório visa aferir o ocorrido, o seu contexto fático, a conduta do acusado, a consequência desta e a sua relação com o ilícito disciplinar apurado.

A comissão deve fornecer elementos para subsidiar a tomada de decisão da autoridade julgadora, seja pelo arquivamento, pela absolvição ou pela punição do agente público processado. Para isso, deve realizar todas as diligências necessárias para demonstrar, se for o caso, o ocorrido e a existência ou não de nexo causal entre a conduta do acusado e o ilícito.

O trio processante deve levantar o contexto probatório, contrapondo, inclusive, possíveis provas e alegações apresentadas pelo acusado, quando estas não demonstrarem o contexto real dos fatos e tenderem a simular uma situação que não condiz com a verdade. Na mesma linha, a comissão deve refutar as provas tidas como ilegítimas ou ilícitas, a fim de não macular o processo e ensejar uma nulidade. As provas ilegítimas ocorrem dentro do processo e violam regra de direito processual, como, por exemplo: depoimento de quem, em razão da profissão, deve guardar segredo (art. 207 do CPP) e oitiva de processado sem a intimação do advogado por ele constituído. As provas ilegítimas são nulas e, sendo o vício sanável, podem ser refeitas ou renovadas. As provas ilícitas são obtidas fora do processo, com violação a regra de direito material (seja constitucional ou legal), como, por exemplo, violação de correspondência e confissão mediante tortura. As provas ilícitas são inadmissíveis no processo, ou seja, não podem ser juntadas aos autos e, se juntadas, devem ser desentranhadas.

Durante a produção das provas, a comissão deve sempre proceder à intimação do acusado e de sua defesa, conforme o caso, para acompanhá-las e contrapô-las. Essa intimação deve obedecer ao que foi exposto no tópico 4.2.7 deste Manual.

Nos tópicos a seguir, serão analisadas as provas que podem ser utilizadas e suas especificidades. Antes, serão apresentados aspectos que se aplicam a todos os tipos de prova: a valoração e o ônus, a prova emprestada, as provas ilícitas.


202 CARVALHO, Antônio Carlos Alencar. Manual de processo administrativo disciplinar e sindicâncias: a luz da jurisprudência dos Tribunais e da casuística da Administração Pública. 5° edição rev. e atual. – Belo Horizonte: Fórum, 2016 – pag. 756.
203 DEZAN, Sandro Lúcio. Direito administrativo disciplinar: direito processual. Curitiba: Juruá, 2013 – pag. 180