7. PRESCRIÇÃO NA LEI Nº 12.846, DE 2013

O art. 25, da Lei nº 12.846, de 2013, fixa os marcos temporais da prescrição no plano da responsabilização administrativa de pessoas jurídicas.

 
Art. 25. Prescrevem em 5 (cinco) anos as infrações previstas nesta Lei, contados da data da ciência da infração ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado. 

 

A Lei Anticorrupção distingue dois inícios diferentes para esse prazo de 5 (cinco) anos:

a) se a infração for instantânea, o prazo se iniciará somente quando houver ciência dessa infração;
b) se a infração for permanente ou continuada, o prazo se iniciará somente quando essa infração se encerrar.

O artigo 25 se limita a mencionar a “ciência da infração”, sem explicitar quem é o sujeito desse conhecimento, ou seja, a norma é silente e não define quem deve tomar conhecimento do fato para que o prazo prescricional comece a correr.

A Controladoria-Geral da União – CGU363 orienta:

Existe amplo debate doutrinário sobre quem é o sujeito que deve tomar ciência da infração e ainda não existe uma posição unânime, ou mesmo razoavelmente pacífica, sobre o tema. Portanto, recomendamos, por cautela, que se utilize o critério de que qualquer agente público que tome ciência institucional de infração da Lei nº 12.846/2013 provoca o início do respectivo prazo prescricional. O fundamento desta posição está em que, apesar das diversas e complexas divisões internas da Administração pública, ela se apresenta como uma só para o cidadão, pois a Administração nada mais é do que a corporificação do Estado. Portanto, entendemos que, se um agente da Administração pública toma ciência de uma infração, ainda que ele não tenha competência para apurá-la, a informação da infração já chegou a um agente estatal e, portanto, já chegou ao Estado. Se o agente em questão não tiver competência para apuração, incumbe-lhe, por dever funcional, encaminhar para a autoridade competente.
Destacamos também que essa ciência deve ser institucional, ou seja, informações veiculadas em meios jornalísticos ou redes sociais não contam como ciência para a Administração pública. Se um agente público toma ciência de uma infração ao ler um jornal ou assistindo a uma reportagem, ele faz isso como um cidadão qualquer – isto é, ele lê jornal como “José das Couves”, e não como “agente administrativo do órgão X”. Somente quando ele encaminha o caso para apuração é que podemos falar que a Administração, como tal, tomou ciência. Um exemplo disso seria o seguinte: ao chegar à repartição, o servidor José das Couves encaminha uma mensagem para a ouvidoria de seu órgão dizendo, “li no jornal Y uma reportagem sobre suposto esquema em que empresas pagam propinas a servidores do nosso órgão; por favor, solicito providências.”

Ressalva-se, porém, o caso de agente público na condição de participante da empreitada ilícita. Nesse caso, devida vênia, entendemos que a ciência não pode ser considerada, em razão da vedação ao benefício da própria torpeza.

Convém ressaltar que, havendo apuração conjunta das infrações administrativas previstas na Lei nº 14.133, de 2021, ou em outras normas de licitações e contratos que também sejam tipificadas como atos lesivos na Lei nº 12.846, de 2013, a contagem do prazo prescricional ocorrerá em 5 (cinco) anos, contados da ciência da infração pela Administração.

A Lei nº 14.133, de 2021, em seu art. 158, § 4º, também determina que a contagem do prazo prescricional de 5 (cinco) anos ocorrerá da ciência da infração pela Administração.

Com a regulamentação do Decreto nº 48.821, de 2024, o art. 7º dispôs que a autoridade competente364 para instaurar o PAR, ao tomar conhecimento da possível existência de ato lesivo à Administração Pública, deverá impulsionar as medidas de apuração dos fatos, sob pena de responsabilização penal, civil e administrativa365, caso não adote as providências necessárias.

Portanto, é fundamental realizar uma interpretação sistemática da Lei nº 12.846, de 2013 (Lei Anticorrupção), do Decreto nº 48.821, de 2024 (regulamentação do PAR em âmbito estadual) e da Lei nº 14.133, de 2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos), para garantir segurança jurídica e efetividade normativa. Deve-se, portanto, adotar uma análise cuidadosa de cada caso concreto.

A Controladoria-Geral do Estado tem adotado o critério da ciência dos atos lesivos pela autoridade competente para instaurar o PAR como marco para o início da contagem do prazo prescricional quanto às infrações previstas na Lei Anticorrupção.

Essa ciência deve ser institucional, ou seja, inicia-se o cômputo prescricional somente quando a autoridade competente toma conhecimento do possível ato lesivo praticado pela pessoa jurídica.

O instituto da prescrição se refere à perda da pretensão ao exercício do direito de ação, por inércia da Administração, e visa garantir a segurança jurídica e a estabilidade das relações sociais. Logo, existem limites temporais para o exercício do poder punitivo da Administração.

Neste tópico, trataremos especificamente da prescrição no sentido de perda do prazo, pela Administração Pública, em dois momentos: 1º) antes da instauração do PAR; e 2º) depois da instauração do PAR, momento em que o prazo prescricional é interrompido.

A prescrição verificada antes da instauração do PAR, chamada pela doutrina de prescrição direta, se dá quando, depois da data da ciência dos fatos pela Administração, tenha transcorrido lapso temporal maior do que aquele considerado como limite para a instauração do PAR, ou seja, a partir da data de ciência dos fatos pela autoridade competente, conta-se o prazo de 5 (cinco) anos para instaurar o PAR. Decorrido esse período sem que tenha sido instaurado o PAR, o procedimento investigatório deverá ser arquivado por ter ultrapassado o tempo legal previsto para instauração.

Em relação à parte final do art. 25 da Lei nº 12.846, de 2013, considera-se que, nos casos em que a infração continuada ou permanente não tiver cessado e não houver ciência ainda por parte da autoridade competente para a instauração do PAR, a contagem da prescrição ocorrerá a partir da data da cessação da infração continuada ou permanente, tratando-se de exceção à regra estabelecida pela Lei Anticorrupção. Ao passo que, a prescrição começa a correr da ciência da infração do ato lesivo, se já tiver cessado.

O PARECER n. 00363/2021/CONJUR-CGU/CGU/AGU, de 03 de maio de 2022366, traz o entendimento sobre a contagem do prazo prescrional relacionado às infrações permantentes ou continuadas:

(…) nos casos em que a ciência do ilícito ocorrer anteriormente à cessação da infração, o termo inicial de contagem do prazo de prescrição para infrações permanentes e continuadas deve recair sobre a data da efetiva cessação da ação infracional, ao passo que, nas situações em que a ciência do ato ilícito se der após a cessação da infração, o termo a quo deve se dar a partir da data da referida ciência.
Com efeito, esta é a interpretação mais consentânea com o princípio da integridade do ordenamento jurídico e está baseada na melhor hermenêutica sistemática do Direito. Uma interpretação literal do texto normativo levaria a resultados esdrúxulos que tornaria norma da prescrição da prática do ilícito único mais gravosa do que a da prática do ilícito continuado ou permanente.
Assim, respondemos às indagações da CRG:

- O termo inicial da prescrição seria exclusivamente a ciência da infração? NÃO
- No caso de infrações continuadas e permanentes, o conhecimento antecipado à cessação de cada uma delas seria o termo inicial de contagem do prazo de prescrição? NÃO
- A segunda parte do artigo 25 da LAC teria tão somente a função de especificar, de forma expressa, a delimitação das infrações que se dilatam no tempo por convenção jurídica (continuadas) ou por extensão de sua consumação no tempo (permanentes)? SIM
- Qual o marco inicial para as situações em que tenha ocorrido o conhecimento da infração, contudo sem a ciência do seu caráter de continuidade ou permanência? A DATA DA EFETIVA CESSAÇÃO DA AÇÃO INFRACIONAL.

Após a instauração do processo, o prazo de prescrição é interrompido (volta a contar “do zero”), nos termos do art. 25, parágrafo único367, da Lei nº 12.846, de 2013.

Assim, deve-se atentar para os prazos prescricionais, sob pena de incidir a perda da pretensão punitiva para responsabilização da pessoa jurídica infratora.

A Lei Anticorrupção também previu outra situação de interrupção da prescrição, qual seja, a celebração de acordo de leniência (art. 16, § 9º, da Lei Federal nº 12.846, de 2013). Assim, com a celebração do acordo de leniência, tem-se o reinício da contagem do prazo prescricional, que passa novamente a correr em sua integralidade, de forma a possibilitar o eventual prosseguimento da apuração, especialmente nos casos de descumprimento das cláusulas então negociadas.

Importante ressaltar que, em situações excepcionais, poderá ocorrer a suspensão do PAR por determinação do Poder Judiciário. Nesse cenário, os trabalhos correcionais ficam sobrestados até que seja proferida nova determinação ou decisão judicial, definitiva ou não, em sentido contrário.

Encerrando-se o motivo pelo qual o processo foi suspenso, a contagem do prazo prescricional é retomada de onde parou e não a partir do zero. Dessa forma, os dias já transcorridos são somados aos vindouros para fins de prescrição.

O legislador mineiro também previu cenários excepcionais de suspensão de processos, a exemplo da situação de emergência, do estado de calamidade pública ou da força maior, mediante expedição de decreto do Chefe do Poder Executivo. Nesse caso, a suspensão do prazo prescricional ocorrerá a partir da decretação da situação de emergência, do estado de calamidade pública ou força maior, permanecendo suspenso enquanto durarem seus efeitos, nos termos do art. 60 da Lei Estadual n° 14.184, de 2002.


363 CONTROLADORIA-GERAL DA UNIÃO. Manual de Responsabilização de Entes Privados. Brasília: 2022. P. 170.
364 Art. 4º, do Decreto nº 48.821, de 2024 – Compete à autoridade máxima do órgão ou da entidade do Poder Executivo, de ofício ou mediante provocação, a instauração e o julgamento do Processo Administrativo de Responsabilização – PAR, observados o contraditório e a ampla defesa. Parágrafo único – A competência prevista no caput poderá ser delegada, vedada a subdelegação.
Art. 5º – A Controladoria-Geral do Estado – CGE, por meio do Controlador-Geral, possui competência concorrente para instaurar e julgar o PAR, e competência exclusiva para avocar o PAR instaurado por outro órgão ou entidade do Poder Executivo.
365 Art. 27, Lei nº 12.843, de 2013. A autoridade competente que, tendo conhecimento das infrações previstas nesta Lei, não adotar providências para a apuração dos fatos será responsabilizada penal, civil e administrativamente nos termos da legislação específica aplicável.
366 Disponível em: https://repositorio.cgu.gov.br/bitstream/1/68063/3/Parecer_363_2021_CONJUR_CGU_CGU_AGU.pdf. Acesso em: 03 de agosto de 2024.
367 Art. 25, da Lei nº 12.846, de 2013 – Prescrevem em 5 (cinco) anos as infrações previstas nesta Lei, contados da data da ciência da infração ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado. Parágrafo único – Na esfera administrativa ou judicial, a prescrição será interrompida com a instauraçã de processo que tenha por objeto a apuração da infração.